"Alegrem-se sempre no Senhor; outra vez digo: alegrem-se!" [Filipenses 4.4]

domingo, 26 de março de 2017

O SAGRADO E O PROFANO

“TUDO O QUE É PROFANO É IMUNDO E QUE TUDO O QUE É SAGRADO É SANTO?”

Levando-se em consideração os aspectos puramente linguísticos e dentro do contexto cúltico da religião judaico-cristã, pode-se afirmar que a definição exigida pela pergunta depende do contexto em que se encontram as palavras.

É interessante observar que a resposta para o primeiro par de termos, aparentemente sinonímicos, “profano-imundo”, deve ser dada na negativa. Isto porque, nem sempre o que é profano deve ser tomado por imundo, já que em contextos diferentes o significado recai não necessariamente em aspectos de pureza, mas de ordinariedade – de coisa comum – por exemplo, a palavra Koinon.

Já o mesmo não pode ser dito do segundo par de termos “sagrado-santo”, pois a própria definição do termo hieros (consagrado) e “santo” (separado), exige que eles sejam interpenetrantes. Sendo assim, tudo o que é sagrado deve possuir necessariamente uma santidade.

Entretanto, os termos, “sagrado” e “profano”, são categorias dicotômicas que servem como ferramentas teóricas à Ciência da Religião, mas especialmente à antropologia e que pela abrangência semântica não se condiciona em reducionismos.

Apesar das línguas originais bíblicas trazerem palavras que expressem a dicotomia em suas variadas nuances, todavia, ela foge à esfera puramente teológica e se difunde culturalmente em outras esferas sociais.

“Sagrado” e “profano” ganham novos significados nas Ciências da Religião. Apresentam-se enquanto categorias teóricas religiosas para explicar o mundo sobrenatural em contraposição ao mundo natural.

Dependendo do campo de pesquisa e da plataforma teórica envolvida ele pode assumir diversos significados.

Há uma discussão muito interessante dos críticos da fenomenologia da religião clássica sobre Rudolf Otto a respeito da categoria explorada por ele em sua obra Das Heilige (O Sagrado) quanto ao termo sagrado. O sagrado para Otto é ontológico e totalmente “Outro”, abrangendo, mas não se esgotando no conceito judaico-cristão de Deus.

Já Émile Durkheim afirmava que “existe religião tão logo o sagrado se distingue do profano” (1996, p.150). Aqui Durkheim não trabalha o sagrado pelo seu aspecto metafísico, na verdade o sagrado pode ser “puro” ou “impuro”. Tudo o que não pode ser sagrado está na esfera do profano.

Para o antropólogo René Girard “É a violência que constitui o verdadeiro coração e alma secreta do sagrado” (1998, p.46). Sagrado para ele possui o significado de religião.

Em Ferraroti o sagrado não aparece esgotar-se na religião institucionalizada que ele denomina de “religião-de-igreja”. Para ele o sagrado se expressa de formas diversas, inclusive na sociedade moderna.

Até aqui, com estes parcos e singelos exemplos, tentei mostrar as várias nuances que o termo adquire nas teorias das ciências da religião.

Apesar de o artigo ter-se desviado sutilmente do propósito original – o teológico – é excitante pensar em uma investigação em direção a definição do termo “sagrado” e “profano” dentro de uma sociedade materialista e dessacralizada como a nossa. Fica aí a provocação.

Referências
DURKHEIM, È. As formas elementares da vida religiosa.  São Paulo: Martins Fontes, 1996.
FERRAROTI, Franco. Una fede senza dogmi. Laterza: Roma-Bari, 1990.
GIRARD, R. A Violência e o Sagrado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998.
OTTO, R. O Sagrado. Lisboa: Edições 70, 2005.

Prof. Paulo Cristiano da Silva

Por Litrazini

Graça e Paz 

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